Angola recuperou seis mil milhões de dólares e apreendeu outros 21 mil no âmbito do confisco de activos, metade dos quais no exterior, anunciou hoje a procuradora-geral adjunta, Inocência Pinto, sugerindo a criação de uma estrutura autónoma para gestão dos activos.
Inocência Pinto salientou que o Estado angolano criou um conjunto de medidas de combate à criminalidade organizada económico-financeira transnacional incidindo sobre recolha de prova, quebra de sigilo profissional e perda de bens a favor do Estado que conduziram a este resultado
A procuradora-geral adjunta falava hoje na abertura de um workshop sobre confisco e administração de activos organizado pela Procuradoria-Geral da República e Organização das Nações Unidas sobre Drogas e Crime (ONUDC),
“Os resultados alcançados podem ser considerados positivos e constituem uma alavanca no sentido da continuidade das acções que visam prevenir e reprimir más praticas na gestão do erário”, salientou, acrescentando que o processo de recuperação de activos coloca desafios e oportunidades
Considerou que é preciso discutir se o modelo adoptado por Angola, com primazia para o fiel depositário, é o melhor face à realidade, realçando que é preciso garantir que os não se deteriorem enquanto se aguardam decisões judiciais.
O Serviço Nacional de Recuperação de Activos (Senra) tem contado com colaboração de várias instituições, como o Cofre Geral de Justiça e o Instituto de Gestão de Activos e Participações do Estado (IGAPE), mas não existe até agora uma entidade com competência exclusiva para gestão dos activos.
Inocência Pinto apontou o desafio de encontrar boas práticas na administração de activos confiscados sob pena de se degradarem, sugerindo a criação de uma “task force” ou uma estrutura de gestão especifica vocacionada para a valorização dos activos, acompanhada por uma comissão de auditoria e membros da sociedade civil para velar pelo interesse comum.
A responsável enalteceu ainda o papel da cooperação internacional, com destaque para o projecto PRO.REACT, onde se enquadra esta iniciativa, já que permite que se desenvolva um sistema eficaz de combate aos fluxos financeiros ilícitos, contribuindo para o crescimento económico e redução da pobreza.
Quando os gatos querem rugir, a “presa” ri, ri muito!
Mais de 600 processos, envolvendo maioritariamente gestores públicos e actores políticos (todos escolhidos pelo MPLA), suspeitos de praticar actos de corrupção e peculato, encontravam-se em Fevereiro de 2019 sob a alçada da Direcção Nacional de Prevenção e Combate à Corrupção (DNPCC). Quantidade não significa qualidade e, por isso, ajuda a prescrever o que mais interessar que assim seja, para além de justificar falhanços por… falta de meios.
Deste número, 190 estavam em fase de averiguação para apuramento de indícios criminais e posterior tramitação processual (instrução preparatória). Ninguém duvida destes dados. Foram divulgados pela então responsável da DNPCC, Inocência Pinto.
Segundo a magistrada, Luanda liderava a lista com mais de 220 casos, dos quais 102 processos de inquérito/averiguação em curso, sob custódia da DNPCC, e 14 de instrução preparatória, em posse do Serviço de Investigação Criminal de Luanda.
De igual modo, informou Inocência Pinto em declarações à Angop, a Direcção Nacional de Investigação e Acção Penal (DNIAP) investigava 101 processos-crime, sobre corrupção activa e passiva, como tráficos de influência, recebimento indevido de vantagens e outros de peculato. Por outras palavras, investiga o dia-a-dia do MPLA/Estado.
“Todas essas formas de corrupção têm merecido tratamento da Procuradoria, em termos investigativos. Para além destes crimes de corrupção, temos outros cometidos por funcionários públicos no exercício de funções, como é o caso do peculato”, especificou Inocência Pinto.
Por províncias, Cabinda detinha quatro processos mediáticos em fase de instrução preparatória, implicando antigos gestores das direcções provinciais da Saúde, da Educação, da Energia e Águas e do Instituto de Estradas de Angola (INEA).
Zaire tinha igualmente quatro processos-crime, Uíge 5, Benguela 32 (5 dos quais no Lobito), Namibe 22, Cunene 30, Cuando Cubango 11, Lunda Sul 33, Lunda Norte 22, Huambo 31, Bengo 15 e Moxico 2. A Huíla contava 51 processos de averiguação/inquérito, o Cuanza Norte 4 processos de inquérito e 13 em instrução preparatória, Malanje 3 de averiguação e 31 criminais, Cuanza Sul 58 processos crime e 15 de inquérito e Bié 7 processos-crime e 1 de inquérito.
“São muitos casos em averiguação nas 18 províncias do país, para se detectar indícios da prática de crimes de natureza económico-financeira. Tão logo concluamos que existem factos que constituem crime, passamos para a fase seguinte, que é a da instrução preparatória”, afirmou Inocência Pinto.
De acordo com a directora nacional de prevenção e combate à corrupção, existiam em alguns processos cuja instrução já fora concluída, que foram introduzidos em juízo, e outros que já tinham passarado por julgamento, sem precisar números.
Quanto aos casos mediáticos, disse estarem em curso o processo contra o antigo presidente do Fundo Soberano de Angola, José Filomeno dos Santos, e o seu sócio Jean-Claude Bastos de Morais.
Mencionou, ainda, os processos contra o antigo ministro (de José Eduardo dos Santos e de João Lourenço) dos Transportes, Augusto Tomás, contra os deputados Higino Carneiro e Manuel Rabelais, e contra o ex-secretário para os assuntos económicos do Presidente da República, Carlos Panzo, todos em fase de investigação.
PGR engasgou-se ou mentiu?
O general Hélder Pitta Gróz, Procurador-Geral da República do MPLA, o único partido que governa Angola há 47 anos, afirmou no dia 16 de Novembro de 2018 que a falta de verbas estava a condicionar a cooperação internacional e o cumprimento de diligências como cartas rogatórias. Que chatice. Era preciso arranjar quem nos dê mais uns milhões de fiado para resolver este problema. Talvez a China, não?
Hélder Pitta Gróz falava na Assembleia Nacional do MPLA num encontro entre as primeira e décima Comissões de Trabalho Especializadas e representantes do Tribunal Supremo, Tribunal de Contas, Tribunal Constitucional, Tribunal Supremo Militar e o Ministério da Justiça e Direitos Humanos, no âmbito da (suposta) apreciação do Orçamento Geral do Estado (OGE) para 2019.
Segundo o Procurador-Geral da República, “os novos ventos, que este ano surgiram”, levavam a Procuradoria a realizar actividades inéditas que tiveram de ser feitas “com ou sem recursos”. É obra, reconheça-se. Fazer “actividades inéditas” e ainda por cima “sem recursos” não é para qualquer um. Bravo, general Hélder Pitta Gróz.
“Não deixamos de fazer o nosso trabalho porque não tínhamos recursos”, disse Hélder Pitta Gróz, para enumerar as dificuldades por que passavam para a execução das actividades.
“Temos outros técnicos que trabalham connosco, trabalham um, dois meses, a ordem de saque não é paga e ele vai embora, porque dizem que não estão para trabalhar de borla”, disse o PGR. Então como é senhor Presidente da República? Então como é senhor Titular do Poder Executivo? Então como é senhor Presidente do MPLA? Assim não vale! Trabalho escravo, só mesmo para os angolanos de segunda.
A situação repete-se com “os próprios investigadores, os magistrados”, apontou Hélder Pitta Gróz. Num Estado de Direito, que é algo que Angola (ainda) não é, o PGR seria demitido (já que, reconhecidamente, não tem coragem para se demitir) ou o Presidente da República (João Lourenço) viria a público – numa comunicação ao país – pedir desculpa e reconhecer que, afinal, só tinham mudado (algumas) moscas.
“Eles trabalham o dia inteiro, de manhã até à noite, e têm de tirar do seu bolso, precisam de comer, de fazer telefonemas, têm de pagar o seu saldo, têm de tirar fotocópias e utilizam o seu dinheiro para isso. Portanto, temos de saber bem aquilo que a gente quer. Temos não só de combater os crimes, como também de fazer a prevenção, e a prevenção também custa dinheiro”, disse Hélder Pitta Gróz.
A PGR conta também com a cooperação internacional, que tem sido fundamental, segundo o magistrado, tendo exemplificado que, em 2017, registaram um total de 124 cartas rogatórias nos dois sentidos – recebidas e enviadas.
“Até Setembro de 2018, já estamos em 300, e isso também é dinheiro, porque as cartas rogatórias têm de ter tradução, de ter fotocópias. Muitas vezes temos de buscar especialistas para nos ajudarem, porque não podemos ver a cooperação judiciária só num sentido, dos outros para connosco. Nós também temos de dar alguma coisa e sentimos isso, às vezes, quando temos contactos com algumas entidades no exterior, em que nós procuramos informação”, referiu.
“Eles perguntam: ‘e vocês o que têm?’ A cooperação judicial não é só ir buscar, tem de se receber e ir buscar e quanto mais se dá, mais se recebe. Se não se dá nada, não se recebe nada e isso é dinheiro”, frisou.
Hélder Pitta Gróz disse estar ciente das dificuldades por que o país passava, mas esperava alguma abertura do Ministério das Finanças. Bem esperou sentado, o que certamente fez num cadeirão cómodo e bem estofado. Nem o ministro de então, Archer Mangueira, nem o Presidente João Lourenço estavam, ou estão, interessados em resolver este e milhares de outros problemas que o MPLA criou ao longo dos últimos 47 anos.
“Temos consciência de que o dinheiro é pouco, mas, se trabalharmos em conjunto com o Ministério das Finanças, podemos ver a melhor forma de gastarmos o pouco que existe. Agora, quando apresentamos uma proposta e depois recebemos a contraproposta, sem termos sido ouvidos, da forma como é feita, dificulta um bocado todo o exercício que se queira fazer”, lamentou.
Folha 8 com Lusa